segunda-feira, 20 de dezembro de 2010

O 9º Torneio de Palitinho do Bar do Espanha

De Dalzimar Tupinambá
Após uma hora e vinte minutos de caminhada, cheguei ao Bar do Espanha, a fim de recarregar parte das energias perdidas. O movimento, porém, estava diferente. Havia várias mesas dispostas na praça em frente ao bar e um imponente troféu, que era o objeto de cobiça dos que ali estavam: os participantes do 9º Torneio de Palitinho.
Os “atletas”, concentrados antes do início da disputa, exibiam suas virtudes e apreensões, inclusive considerando a presença de poucas representantes do sexo feminino, uma vez que o torneio passado foi vencido por uma mulher. Agora com Dilma presidenta, o temor aumentava.
Mulher – afirmava um dos participantes, com absoluta seriedade – não tem lógica. Vem sem nada e pede muito, vem com muito e pede pouco. Não dá para marcar e as danadas dão sorte, acabam vencendo. Esqueceu ele, penso eu, que a mulher tem o dom de iludir.
O torneio começa. A regra é simples. Em cada mesa seriam eliminados uns – os que iam ficando para o fim daquela rodada – e os outros vencedores iriam para a fase intermediária, até a fase final, com as eliminações que ocorreriam em meio a isto. É permitido “encostar” em um número já cantado por um dos participantes na rodada. Os que continuavam na pugna, portanto ainda com chance de vencer, usavam o seguinte bordão: “avisa lá, avisa lá, que eu vou, avisa lá, que eu vou”.
Seguia-se a acirrada disputa, em que os eliminados juntavam-se a nós, meros espectadores, e a partir daí a verve itaparicana fluía inapelavelmente. Afinal, todos se conhecem e, por isso mesmo, gracejam entre si. Há ofensas brandas, outras nem tanto assim, algumas de gosto duvidoso, mas tudo com fina ironia. São hiperbólicos por vocação e grandiloqüentes por natureza. Quem observa essa especial trama, jamais sabe se se está a dizer a verdade, a mentir abertamente ou um pouco de cada. Nessa simplicidade em estabelecer tais conversas, reside a singela elegância que pontua o Bar do Espanha, cujo proprietário assiste a tudo placidamente.
De algo tenho certeza, as pilherias, que seguiam firmes em um ambiente democrático, sem preconceito algum, em uma natural harmonia, são de dar inveja a certos “mauricinhos” e “patricinhos”, além dos esnobes de sempre, mas sem a mínima criatividade e espontaneidade dos “atletas” e dos que ali freqüentam.
Eis que surge o vencedor do torneio – Helinho – que comemorou com certa parcimônia e discrição o grande feito, com largo sorriso e braços apontando para o alto.
Mas as gozações entre os freqüentadores do Bar do Espanha e os “atletas” do palitinho continuavam sem fim, mediante incrível interação entre grupos distintos, como se aquela babel instalada guardasse alguma lógica, já que um palpita dali, outro palpita daqui na conversa de que não faz parte, a resposta surge pronta e a vida segue tranqüila.
Era hora de ir. Já havia tomado a quota que me cabia, recheada embora por essa trupe heterogênea e interessantíssima. Despedi-me. Recebi o cumprimento afetivo de vários. E aí, meio sem jeito, tentei obter uma camisa do torneio.
Morri na praia. Com a fleuma itaparicana, que marca indelevelmente os que aqui residem, a negativa foi simples, adornada por maroto sorriso e o exagero de sempre: “Amigo, fica para o próximo torneio, mas chegue mais cedo. Esta aqui custou o suor do meu rosto”. Depois dessa, fazer o quê?

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